Cinema e Jornalismo discute série documental sobre ativismo artístico em São Paulo
Produzir um documentário sobre arte e coletivos urbanos em uma cidade como São Paulo pode parecer um trabalho muito grande, mas, por outro lado, por ser tão grande, há sempre algo novo a ser contado.
É usando deste benefício que a cineasta Tata Amaral e sua equipe sai às ruas para mostrar e contar as histórias de coletivos culturais engajados em questões sociais, políticas e artísticas com o "Causando na Rua", que agora está em sua segunda temporada.
A série de documentários de aproximadamente 26 minutos cada apresentam as intervenções urbanas conhecidas como "ativismo artístico". A primeira temporada do programa foi tema de discussão no último encontro do curso Cinema e Jornalismo: Luzes sobre São Paulo, módulo do Projeto Repórter do Futuro que se debruça sobre as conexões entre a arte cinematográfica e a produção jornalística.
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"O causando na rua é um programa eterno. Quando a gente começou a fazer o Causando na Rua, percebemos a intensidade da preparação desses artistas. Eles sabem muito bem do que estão falando, estão problematizando questões e é muito bonito", pontuou a cineasta.
Antes de ir às ruas, no entanto, Tata Amaral ressalta a importância da pesquisa para a produção de um material como esse. No trabalho feito por ela, há um planejamento de pesquisa prévio, antes da gravação, e um trabalho posterior, de checagem das informações que confirmam e respaldam o que foi dito pelos entrevistados.
Essa é uma maneira que Tata Amaral encontrou de contar as histórias e garantir a fidelidade dos fatos narrados. Sua equipe conta com a participação de profissionais que se dedicam exclusivamente a buscar fontes oficiais que confirmem os relatos.
A cineasta Tata Amaral em conversa com repórteres do futuro.
Tata Amaral conta que essa prática ganhou mais peso após o episódio chamado "Tapete Manifesto", que apresenta o grupo Galeria Gruta, que cria um tapete inspirado nas tradições de Corpus Christi, mas ao invés de temática religiosa aborda o assassinato de mulheres.
"Eu perguntei [para uma das ativistas] de onde tinha vindo a ideia de fazer o tapete manifesto e ela respondeu "eu sou mineira e me inspirei em duas tradições brasileiras, uma é o tapete de corpus christi e outro é assassinato de mulheres." A partir daí o causando na rua tomou a forma de, muitas vezes interromper os diálogos, não deixar nada passar sem que aquilo tivesse um fundamento. A gente passou a ter a pesquisa inicial do artista, dos territórios, fazíamos mapas para ter a noção da ocupação… e também uma pesquisa inspirada nas entrevistas e na ação", conta a cineasta.
Dados e diversidade no audiovisual
Ao se referir à pesquisa usando fontes oficiais como a Ancine e outros órgãos públicos, Tata Amaral ressalta que atualmente esse contato tem sido prejudicado devido ao apagão de informações pelo qual o Brasil passa.
"Acho que uma coisa que aconteceu e que vale refletir é que eu era muito firme com os pesquisadores, exigindo fontes oficiais. A gente fez a última temporada em 2016. Em 2018 eu estava fazendo uma pesquisa em algum projeto, e quis voltar em alguma fonte que não tinha mais – não tinha Ministério da Cultura… então as pesquisas onde foram parar? O que eu descobri ali é que a democracia produz dados, o autoritarismo não produz dados", disse.
Essa produção de dados apontada pela cineasta diz respeito à pesquisa e criação de metodologias para a pesquisa que indiquem caminhos para políticas públicas.
"Quando você pesquisa, descobre que apenas 19% dos filmes lançados comercialmente em 2015 foram feitos por mulheres e que nenhuma delas era negra, você tem na sua frente dados de racismo no audiovisual e da assimetria da distribuição de recursos. Por que 19% se a maioria [da população] é de pessoas negras e mulheres? Se você esconde esses dados, apenas se desconfia que o audiovisual seja machista e racista", pontuou.
A primeira temporada de Causando na Rua está disponível gratuitamente na plataforma de filmes da SPCine Play.
A produção dos documentários é assinada por Tata Amaral, Maria Farkas e Caru Alves de Souza. Os episódios foram filmados em São Paulo, Osasco e Santo André - região metropolitana do Estado.
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